Abertura do Setembro Amarelo tem ampla participação do público

09/09/2022 17h50 - Atualizado em 09/09/22 17h53

Suicídio pode ser definido como a morte em si mesmo. É um ato que vai ser executado pelo próprio indivíduo contra a própria vida. O que é um conceito aparentemente claro e óbvio é, segundo o psiquiatra Bruno Brandão, não tão simples, porque para ser caracterizado é preciso que seja definida a intenção de morrer, algo fácil de compreender na teoria, mas não na prática. Exatamente para esclarecer o tema, o Tribunal de Justiça Militar do Estado de Minas Gerais promoveu nesta sexta-feira, 9, a palestra on-line “Suicídio – Entender para prevenir”, com ampla adesão e participação de servidores e público externo interessado no assunto, inclusive de outros estados, como São Paulo. A palestra marca a abertura da campanha Setembro Amarelo no TJMMG, buscando trazer o suicídio à luz, para tentar diminuir os números relacionados a este transtorno, que são bastante preocupantes.

Segundo o psiquiatra convidado, 800 mil pessoas morrem ao ano por suicídio. A cada 40 segundos, uma pessoa se suicida, e a cada três segundos alguma ao menos tenta. O Brasil está entre os dez países que mais registram este tipo de morte – é o 8º em números absolutos – e estima-se que esse índice ainda vá dobrar nos próximos anos.

O número de mortes por suicídio, hoje, é maior que o de vítimas de homicídio e guerra, então é algo realmente muito significativo. Mulheres normalmente tentam mais, porém os homens cometem mais, e isso está muito relacionado ao meio – os homens, de um modo geral, são mais agressivos na hora de se matar.

Durante a palestra, o especialista explicou como a sociedade encarou o suicídio ao longo da história, partindo de um direito ou uma questão de honra na Antiguidade, passando pela Idade Média, quando começa a ser uma prática condenada, até os dias atuais, quando está sendo visto sob a tutela da Ciência. “Hoje, a gente entende que o suicídio é totalmente prevenível, porque 97% dos casos estão associados a transtornos mentais, a algum quadro psiquiátrico. Os outros 3% a gente não consegue fazer um diagnóstico claro, mas provavelmente estão associados a crenças, muitas vezes até disfuncionais, como por exemplo no caso de homens-bomba, ou crenças religiosas”, exemplificou. “A imensa maioria dos suicidas estão passando por algum problema. Quando você trata esse problema, essa intenção vai embora”.

Bruno Brandão, que é membro titular da ABP, especialista em dependência química pela USP, pós-graduado em terapia cognitiva comportamental pela PUCRS e com certificação em neurociências pela PUCRS, citou alguns mitos. Um deles é a crença de que, se uma pessoa pensa em se matar, ela vai ter o risco para o resto da vida. Outro mito é que pessoas que ameaçam se matar não o fazem. “Inclusive a tentativa de suicídio anterior é um dos principais fatores de risco para que a pessoa venha a cometer suicídio. Na verdade, quem se suicida já tentou outras vezes antes”, revelou.

O exercício de falar sobre o tema, ao invés de ser prejudicial como muitos pensam, pode ser terapêutico, orientou o psiquiatra. “Falar sobre suicídio tem um efeito protetor e diminui a chance de que a pessoa venha a se matar. Muita gente tem medo de perguntar, porque acha que vai induzir a pessoa, ou também porque se a pessoa responder que quer se matar ela não sabe o que é que vai fazer com a resposta”, disse.

Risco – De forma muito didática e acessível, o psiquiatra convidado explicou que há alguns fatores de risco. A já citada tentativa prévia é o maior desses fatores, mas há também os transtornos psiquiátricos (como transtornos de humor, de personalidade, esquizofrenia, etc.), aspectos psicológicos (perdas recentes, baixa capacidade de lidar com frustrações, ter sofrido abuso físico ou sexual na infância, entre outros) e condições de saúde física (como doenças crônicas). Há uma faixa etária mais propensa, entre 15 e 30 anos, e um segundo pico acima de 65 anos, e existe ainda o chamado perfil “DDD do suicídio”, quando a pessoa vive um quadro de desesperança, desespero e desamparo. “É um fenômeno muito complexo”, pontuou Bruno Bradão.

Para entender como agir diante de uma pessoa com pensamentos suicidas, o especialista orientou sobre como identificar se o risco é classificado como baixo, moderado ou alto. No risco de suicídio baixo, estão pessoas que nunca tiveram tentativa prévia e que apresentam ideias suicidas apenas passageiras e perturbadas. Nelas, o transtorno mental geralmente é controlado e adere-se bem ao tratamento. Outras características fundamentais: não há um plano definido sobre como se matar, e há um apoio social. “Nesse caso você oferece apoio emocional, vai ouvir sem julgamentos. É interessante focar em como a pessoa lidou com o problema no passado e marcar uma consulta com psiquiatra ou psicólogo”, sugeriu.

No risco moderado, já há uma tentativa prévia e um quadro mental depressivo, ou um transtorno bipolar. Há, também, ideias recorrentes e persistentes em que o suicídio parece a solução de algum problema. Ainda assim, não se trata de uma pessoa impulsiva e nem tem problemas com álcool ou drogas. Como no risco baixo, a pessoa tem apoio social.

Assim como no moderado, no risco alto há tentativa prévia de suicídio, mas as depressões são mais graves, há quadros de delírios, alucinações, muitas vezes associados a álcool e drogas. A pessoa tem um plano bem definido e escolheu o meio pelo qual pensa em tirar a própria vida, não vê saída para o problema e muitas vezes não quer se tratar. Nesse caso, o psiquiatra orienta a nunca deixar a pessoa sozinha, deve-se impedir que tenha acesso a qualquer meio letal e é necessário fazer uma avaliação psicológica de urgência, pois se trata de um paciente que mereça até ser internado.

“Se o paciente estiver muito ansioso ou agitado é, sim, necessário fazer uma contenção temporária, química ou mecânica, e é muito provável que vá precisar de internação psiquiátrica”, pontuou.

Com um diagnóstico preciso, tratamentos médico e psicoterápico adequados e uma rede de apoio, o psiquiatra ressalta que o suicídio é prevenível, podendo ser evitado. “A ideia que eu queria deixar é que, de um modo geral, ninguém quer morrer. A pessoa quer acabar com um sofrimento ou ter uma gratificação que acredita que vá ter, como no caso dos delírios religiosos e outros delírios. Tem um componente impulsivo, e nesses pacientes, quando tratam, o desejo vai embora”, disse.

Campanha – O Setembro Amarelo é uma campanha nacional organizada pela Associação Brasileira de Psiquiatria – ABB, em parceria com o Conselho Federal de Medicina – CFM, com mobilização de diversas instituições para se debater o tema do suicídio, em especial no dia 10 de setembro, marcado como o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio. A palestra ofertada pelo TJMMG foi uma iniciativa do Serviço de Comunicação Institucional – Secom, em parceria com a Comissão Gestora do Plano de Logística Sustentável e com a Escola Judicial Militar – EJM.

“Nós, da Comissão de Logística Sustentável, e também a Comissão de Saúde, recebemos com o coração aquecido e também com muito entusiasmo esse tipo de iniciativa, porque vemos a sua profunda importância para as instituições e para o Direito. E eu me permitiria lembrar a todos que o Estado de Direito nasce com a configuração que tem hoje depois das evoluções modernas do século XVIII, tendo como um dos seus propósitos fazer com que as instituições político-jurídicas funcionassem como uma espécie de mediação do chamados Ethos, do consenso ético dos indivíduos”, destacou aos presentes o desembargador Fernando Armando Ribeiro, presidente da Comissão Gestora do Plano de Logística Sustentável.

“Nunca podemos nos descuidar da realidade concreta da vida desses indivíduos em sociedade, e é nesse sentido que vejo a importância de abordarmos um tema como o suicídio, porque muitas vezes é tratado como tabu, e o tabu é aquilo sobre o qual não podemos falar. E ao não poder falar sobre ele, nós perdemos a chance de compreendê-lo e de nos darmos conta das suas razões mais profundas, portanto perdemos a chance de enfrentá-lo de uma maneira mais eficaz, e também de repensarmos as nossas próprias instituições e nossos próprios modos de vida”, concluiu o desembargador.

Texto: Secom TJMMG