Homenagem ao Ministro Adhemar Maciel ( 1928-2014). Membro da Academia Mineira de Direito Militar.

09/01/2015 15h33 - Atualizado em 09/01/15 15h33

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Adhemar Maciel, ser humano exemplar

Fernando Armando Ribeiro[1]

Refletindo sobre a morte, disse certa vez Jorge Luis Borges que com ela vai-se “um rosto que não se repetirá jamais. Cada homem tem um rosto que é único; com ele morrem milhares de circunstâncias, milhares de lembranças; morrem lembranças da infância e morrem traços humanos, demasiado humanos” (BORGES, Jorge Luis. Sete noites. Max Limonad, 3a ed, p. 131). A despedida de alguns, todavia, parece atingir mais visceralmente a toda humanidade. É que alguns homens parecem ter sido criados para nos mostrar quão mais amplas são as nossas possibilidades de perfeição, de inteligência e de bondade. Adhemar Ferreira Maciel foi um desses homens. 

Sua atuação profissional, familiar e social teve sempre a marca indelével da dedicação, do equilíbrio e da generosidade. Magistrado exemplar, fez da magistratura verdadeiro sacerdócio, vivendo e vivenciando intensamente as alegrias e agruras da carreira, em que pôde galgar todos os degraus: Juiz Federal de primeira instância, atuando em Goiás e em Minas Gerais, Juiz (hoje o título seria Desembargador) do Tribunal Regional Federal da 1ª Região e Ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em todos os cargos deixou estampada sua vocação para o Direito e seu amor à causa da justiça.  

Seu profundo conhecimento e refinado gosto pelas artes, cinema e literatura convergiam para a formação integral do humanista, que se revelava em suas decisões e textos jurídicos. Humanista de fato ele o era, no correto e bom sentido da palavra. Não dos que empunham sofisticados conceitos  e ideias apenas como ornamentos retóricos. Ao contrário, fazia da preocupação com a face humana que se esconde em cada processo sua verdadeira missão.  Assim, notáveis são suas avançadas decisões no STJ em defesa das liberdades constitucionais, sobretudo em matéria penal.

Professor e escritor, brindou o Direito Público brasileiro com inúmeros artigos publicados em periódicos especializados e com o instigante livro “Questões de Direito Público”, em que demonstra, a um só tempo, a riqueza de seu conhecimento teórico, e seu profundo compromisso com o aprimoramento prático das instituições judiciárias nacionais. No prelo encontra-se ainda uma obra que lhe custou mais de uma década de pesquisas, e que sairá em breve pela editora Del Rey. Versa sobre  o direito constitucional norte-americano, paixão de toda sua vida e do qual fora um dos estudiosos mais abalizados.

A brilhante trajetória profissional de Adhemar Maciel, porém, não é senão uma pálida projeção de sua grandeza humana. Congregava em si tantas virtudes que parecia às vezes um ser ideal. Aristóteles Atheniense bem o soube sintetizar ao dizer que “Adhemar Maciel é um homem sem defeitos”.  Uma das mais destacadas virtudes era sua espontânea e nada pretenciosa modéstia, a que aliava profunda serenidade e firmeza de caráter.  Tratava a todos com indistinta cortesia, e sempre procurava ler os fatos e acontecimentos com uma pitada de humor. Não se fazia refém de cargos, títulos ou honrarias e procurava ver as pessoas, sempre  e antes de tudo, como pessoas.

Por isso, apesar de tímido, fez verdadeira legião de amigos e admiradores que hoje choram sua partida. Muita falta nos farão sua sabedoria, generosidade e integridade. Todavia, a saudade que hoje nutre nossas lágrimas é também o caminho que lhe assegurará, entre nós, a permanência. Cultivemos a memória de Adhemar Ferreira Maciel, para que as gerações vindouras possam conhecer a vida e a obra deste ser humano exemplar.



[1] Juiz Corregedor do TJMMG; Diretor Adjunto da Escola Nacional da Magistratura da AMB e Professor da PUC-Minas

 

Artigo publicado no jornal Correio Brasiliense de 22/12/2014