Controle da ação policial

03/06/2014 17h28 - Atualizado em 03/06/14 17h28

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O desafio é conciliar a eficácia da atividade da polícia com o respeito aos direitos individuais e coletivos

Por: Rodrigo Xavier da Silva
Ouvidor de polícia da Ouvidoria-Geral do Estado de Minas Gerais

Um desafio sempre presente nas sociedades democráticas é o de conciliar a eficácia da ação policial com o respeito aos direitos individuais e coletivos. Para enfrentar esse desafio é que se criaram, em muitos países, mecanismos de controle interno e externo da atividade policial.

Se todos os órgãos públicos devem prestar contas à sociedade, a polícia, que exerce o monopólio do uso legítimo da força conferido ao Estado, precisa, também, submeter-se a alguma forma de controle.

“Quis custodiet ipsos custodes? “Quem vigia os vigias?”, já perguntava em Roma, nos primórdios da era cristã, o poeta satírico Juvenalis (70 a 138 d.C.). Ao que se pode acrescentar outra indagação: como vigiar os vigias. Não há uma resposta única para essas perguntas: diferentes países têm adotado modelos de controle muito variados, tanto no formato institucional quanto na abrangência dos poderes e no modo de atuação. Todos, porém, com a mesma preocupação de fazer com que as polícias prestem contas de seu trabalho e respondam pelas consequências de suas ações.

Vale lembrar, por oportuna, a advertência do ilustre jurista Fábio Konder Comparato: “Se a essência da política é a relação de poder entre governantes e governados, o magno problema de toda organização constitucional foi e sempre será a instituição de limites ao exercício do poder”.

E o poder, já ensinava Montesquieu, “vai até onde ele encontra os seus limites”. O controle externo das políticas públicas — a da segurança pública, inclusive — tem sua fundamentação no princípio da participação direta do cidadão na gestão pública, inscrito na Declaração Universal dos Direitos Humanos, que, em seu artigo XXI, inciso I, assegura que “todo ser humano tem o direito de fazer parte no governo do seu país, seja diretamente, seja por intermédio de representantes livremente escolhidos”.

O controle externo das políticas públicas é também acolhido integralmente pela Constituição Brasileira de 1988, em diversos dispositivos voltados para a garantia de uma gestão democrática das políticas públicas, especialmente quanto “às formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente as reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral” (artigo 37, §3º, I).

Vê-se, portanto, que tanto o controle interno, exercido pelas corregedorias, quanto o controle social externo, exercido pela Ouvidoria de Polícia, não existem para retirar autoridade da polícia. Ao contrário, ambas as formas de controle existem para conferir eficiência, legitimidade, transparência e autoridade ao trabalho dos bons policiais.

Em Minas Gerais, a partir de uma concepção de gestão integrada da segurança pública, foi possível avançar, também, no aperfeiçoamento das instâncias de controle e correição da atividade policial com a definição do marco legal de criação da Ouvidoria de Polícia, em 1997, no fortalecimento das corregedorias de Polícia ao longo dos anos e, ainda, pela criação do Colegiado de Corregedorias dos Órgãos de Defesa Social, em 2003.

Essa sinergia de esforços dos órgãos de controle da atividade policial tem possibilitado um trabalho que vai além do “apontamento e punição de desvios, excessos e irregularidades cometidos pelos integrantes das instituições policiais”, para a adoção de uma filosofia que almeja medidas preventivas concretas e saneadoras das ações irregulares.

Mais do que punir, é preciso prevenir! Esse deve ser o legado da gestão integrada de controle da atividade policial em Minas Gerais. Um legado sustentado na indivisibilidade entre segurança pública e a defesa dos direitos humanos, na transparência e rigor das punições de condutas desviantes e no respeito e fortalecimento incondicional da atuação policial exercida com ética, técnica e legalidade.